segunda-feira, 8 de junho de 2015

VIAGEM À NASCENTE DO RIO GRANDE. Abri este blog para a narrativa. Sempre alguém se interessa... Vou publicando um trecho por dia, para não encher muito a paciência.



INTRODUÇÃO.

Os assuntos e as palavras estão por toda parte. Nós e o alfabeto é que somos limitados. Mas enquanto o alfabeto permite uma infinidade de palavras, nós vivemos a martelar sobre o mesmo assunto. Uns só falam de futebol, outros de religião. Alguns só pensam em corrida e outros só em política partidária. É um que só fala da empresa em que trabalha, é outro que vive para a literatura, e um outro cuja vida consiste em juntar dinheiro. E há aqueles vários que só falam e escrevem abobrinha, abusando da arte de cortar e colar. Mas há um tipo especial. É aquele que pensa muito e ricamente, mas guarda tudo pra si. Nas redes sociais, quando ele está, é só pra acompanhar os amigos e desejar feliz aniversário. Esse é o que mais me preocupa. É alta a probabilidade de estourar-lhe uma artéria vital precocemente.

E Deus e o Diabo também estão por toda parte. Em nosso corpo. Com nossa complexa combinação de hormônios e enzimas a regular nervos e músculos e tendões e cartilagens. E tecidos esponjosos... E ossos que se vão descalcificando. E articulações que vão perdendo a graxa. E banhas. E em nossa mente. Em saudades insatisfeitas. Em remorsos insepultos. Em projetos abandonados. Em mágoas e frustrações. O Diabo nos ataca nos silêncios de alta noite, quando nos lembra da linearidade dos tempos a impossibilitar qualquer retorno, qualquer conserto. Quando a grandiosidade do cosmo cai sobre nós e nos conscientiza momentaneamente da nossa pequenez. E então bate o desespero.

Mas o corpo e a mente podem se comunicar com a natureza e cultivar o campo agreste em que vivemos. Mitigar dores e desesperanças. O corpo e a mente e a natureza estão por toda parte, nas estradas vicinais de Minas, no ar tropical e úmido de beira rio do sul de Minas Gerais. E assuntos, aguardando garimpeiros, nas extensas margens do Rio Grande.

SUJEITO E OBJETO.
Eis a nascente. Só falta a água escorrer morro abaixo.

O Rio Grande banha a aldeia em que nasci, lá no norte do Estado de São Paulo. Guaraci. Depois escrevo mais sobre esse rio. Por enquanto, lembro isso apenas para justificar meu roteiro de viagem. Seguir rio abaixo ou seguir rio acima? Seguir o rio. Mas 1360 Km era muito para o tamanho da minha necessidade. Porque é isso que tem da sua nascente até seu encontro com o Rio Paranaíba, pra formar o Rio Paraná, lá no vértice dos estados de Mato Grosso do Sul, Minas Gerais e São Paulo. Metade disso era o suficiente para meu gasto.

Foi assim que, em 19 de maio de 2015, embarquei num ônibus no Terminal Rodoviário do Tietê e desci em Franca por volta do meio dia. Extremo nordeste do estado de S.Paulo, próximo ao ponto em que o rio passa a constituir a divisa com Minas, resolvi subir. Poderia descer, mas resolvi subir. Território menos explorado por empresas agrícolas, por causa do relevo mais acidentado. Menos e menores cidades. Fauna e flora menos dilapidadas. E menos represas. Mais água corrente, mais rio de verdade. Porque o rio, em seu médio e baixo curso, é uma sucessão de lagos artificiais promovidos por barragens construídas por Furnas, CEMIG, CESP... para geração de hidreletricidade. Boa parte da energia elétrica consumida no sudeste vem das águas do Rio Grande. E tenho tendências radicais. Preocupa-me o âmago das coisas. Por isso, nada mais lógico que ir à nascente do rio.

Sem um propósito, ninguém sai do lugar. Não creio na existência do flâneur. Quem sai por aí sem destino é porque não tem outra alternativa e quase sempre está mentalmente debilitado. Um cidadão comum carece de um destino. Um sujeito precisa de um objeto. Não tem nada mais sem graça do que um verbo intransitivo. Alguns caminham com o objetivo de chegar a Santiago de Compostela, outros de chegar a Meca. No Brasil, muitos caminham para chegar a Aparecida do Norte, ao Bom Jesus de Pirapora, ao Juazeiro do Padre Cícero. Há quem caminhe para chegar ao Pico da Bandeira ou ao ponto mais alto da Mantiqueira. Há quem dê dez voltas no quarteirão, quem caminhe uma hora no parque. Por duas semanas, caminhei em direção à nascente do Rio Grande. Para mim, era um destino suficiente. Mas, para os apressados, vamos ao resumo da viagem. Em seguida, virão as crônicas inspiradas por locais ou pessoas ou situações vividas durante o caminho. (CONTINUA. Quem desejar ler o relato todo de uma vez, 27 páginas, avise-me pelo e-mail robertobuzzo@gmail.com).

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