GUAPÉ
Praia de argila no Mar de Minas. Lago baixo, por causa da seca. Próximo a Guapé MG. |
Cheguei na beira do porto árido de árvores e areias, de
argilosas praias. A balsa deu meia volta me deixando a ver navios imaginários.
Guapé do outro lado, por causa de um minuto de atraso eu teria de esperar a
balsa ir e voltar. A cidade de Guapé, contra a vontade, pontificando a
península artificial que apontava na margem oposta, arredada que fora quando da
inundação do mundo. O mundo de água e ar e argila e nenhum cuitelo.
Guapé ficava
na beira do Rio, havia uma ponte para unir as margens. É incrível como a
caboclada gosta de uma baixada, de uma beira de rio. Ninguém constrói a casa lá
em cima, no morro. Toda cidade ou povoado fica no vale. Acho que por causa da
facilidade do acesso à água. Aí veio Juscelino e inventou de construir uma
barragem enorme, para represar o rio. Juscelino, com sua mania de desalojar os
acomodados. Os funcionários públicos federais, com a mudança da capital do Rio
para o nada do planalto central.
Os caboclos ribeirinhos, com seus pitos e suas
violas e seus ranchos de pau a pique e seu centenário conformismo, com a
inundação de suas terras. Guapé foi inundada, o governo construiu outra cidade
mais pra cima. Por isso a igreja tem arquitetura moderna – será que é do Niemeyer?
esse ideólogo de igrejas tão lindas e tão claras onde até se esquece de rezar -
e as praças e as ruas têm um traçado
muito diferente das outras cidades próximas.
O sertão virou mar em 1963 e as
turbinas hidrelétricas começaram a girar em 1965. Minas finalmente ganhou um
mar. Muita gente desgostosa deixou a região. Muitos fazendeiros se negaram a
vender as terras ao governo (indenização). Para eles, havia no mundo uma única
lógica na transação de terras. A lógica da propriedade privada. Não queriam
vender, não estavam interessados no negócio. Até que a água subiu, coisa de
Deus, e o mundo de muita gente submergiu, como se fosse o Dilúvio. Entraram na
Justiça, houve suicídios, muitos se mudaram para Pratápolis.
Onde havia a
ponte, hoje há a balsa, operada gratuitamente pela operadora da barragem. E a
cidade é sem graça. O rio passava e o mar agora fica parado no meio do
território do município, algo pouco lógico, considerando que esse rio, uma
centena de quilômetros abaixo, divide dois estados. E considerando o costume de
usar grandes acidentes naturais como limites administrativos intermunicipais.
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