domingo, 14 de junho de 2015

Mata-burro e MATA-MOTO: Estradas.

ESTRADAS EM TERRA OU ASFALTADAS?
Ponte sobre um afluente do Rio Grande, perto de Sousa.

Qual a melhor para caminhar? Depende. Em geral, as não pavimentadas são melhores, mas não por esse motivo em si. Correr na terra é melhor que correr no asfalto, por causa do menor impacto na pisada do corredor, fator importante para sua saúde. Mas para o andarilho, o impacto é mínimo e essa diferença é  insignificante. Outros fatores, como a intensidade e a velocidade do tráfego de veículos e a regularidade do piso são mais importantes. 

O pior cenário para o caminhante é uma estrada em terra mas muito bem conservada, que liga dois pontos de grande atração de veículos. Passei por isso entre S.J.B.do Glória e a MG-050, 20 Km paralelos à margem norte do rio. Os veículos, muitos caminhões, atingiam facilmente 80Km/h e levantavam um poeirão.  Horrível. O melhor cenário seria uma estrada asfaltada que liga a vila a 4 ou 5 fazendas. Sem carretas e ônibus, cruzaríamos com meia dúzia de automóveis apenas no prazo de duas horas.

 Em igualdade de condições de tráfego e de paisagem, é melhor caminhar no asfalto, por causa da ausência de poeira e da maior regularidade do piso. Porém, na prática, isso nunca acontece. Estrada asfaltada significa muitos carros passando em alta velocidade. Se for uma rodovia inter-regional, pior, por causa do grande número de caminhões e da maior pressa dos motoristas. Sem contar o traçado mais reto e menos sujeito à vida local – a grande diferença das estradinhas locais em terra. Nesse sentido, o trecho mais bucólico em que passei foi entre Bom Jardim e Liberdade, uma estradinha estreita e paralela ao Rio Grande, 22 Km, construída pelos escravos para passar trem. Só que o projeto parou no meio e virou estrada comum, em terra, onde não passa ninguém.

AS ESTRADAS VICINAIS.

Vicinal de vizinho. Aquelas estradinhas que saem da zona urbana em direção às chácaras, sítios e fazendas e normalmente morrem lá pelo final do território municipal. Quase sempre em terra, precárias, muitas com mata-burros e porteiras, vão formando uma malha viária para atender as necessidades locais de acesso. Assim, são comuns os cruzamentos e bifurcações e derivações. Porém, quase sempre, essas malhas viárias locais se interligam com a malha viária local do município vizinho. Essa ligação única e pouquíssimo frequentada é o maior desafio do andarilho que se aventura a sair de uma cidade e ir até a outra por esse caminho e não pela rodovia asfaltada que liga os dois polos urbanos. 

Eu sempre me aventuro por esses caminhos. Faço o levantamento prévio nos mapas do Google e levo anotado num papel(só descobri no último dia que o GPS do celular mostra sua localização mesmo sem sinal de internet). O problema é que, em  geral, não há placas indicativas e é impossível anotar numa simples folha a enorme quantidade de variantes, nem as fotos dos satélites permitem isso. Então saio na fé e na intuição.

 A orientação de sempre optar pela variante mais batida às vezes nos faz dar com os burros n’água. Nessa viagem, me perdi duas vezes. No segundo dia, entre Claraval e Ibiraci e no 13º dia, entre Santana do Garambéu e Bom Jardim de Minas. No primeiro caso, era uma situação clássica como a descrita acima. As estradas iam-se apagando, apagando, e cada vez ficava mais difícil decidir entre as variantes. Até que atingimos aquele caminho único que liga as duas malhas e onde praticamente não passa ninguém, já que há uma ligação rodoviária asfaltada para tal. Os usuários daqueles dois últimos sítios, cada um vai para um lado e o pequeno trecho é usado raramente. Ali é o ponto máximo das nossas dúvidas, enquanto os caminhos vão-se acendendo novamente, à medida que a nova urbe se aproxima. É o local de maior cansaço, porque a dúvida gera cansaço. A dúvida e o desgosto. E muitas vezes coincide com o espinhaço de uma serra ou as pirambeiras de um vale – acidentes naturais que costumam delimitar limites intermunicipais -  o que só agrava o problema. Já no segundo caso, não havia rodovia alternativa. Era uma questão simples de complexidade viária.

MATA-MOTO.

E mata-bicicleta e mata-burro. O advento do automóvel no meio rural trouxe a necessidade de inventar o mata-burro, nas estradas sem cerca que passam no meio do pasto. Há uma porteira em cada divisa de fazenda e descer do carro em cada uma é dose. Tenho alguns leitores que não fazem ideia do que um mata-burro. Uma vala transsversal de 2 metros de largura e um metro de profundidade interrompe a estrada. Sobre ela são colocadas no sentido transversal vigas de madeira ou aço espaçadas entre si 10 centímetros. Têm a função de impedir a passagem de muares, equinos e bovinos, porque, se o fizessem, suas patas entrariam entre as vigas e acabariam presos com elas quebradas. Enquanto isso, o pneu passa tranquilamente. Por isso, ao lado, deve haver uma porteira para permitir a passagem de cavaleiros e veículos de tração animal. Só que no sul de Minas não há mais tais veículos, porque as porteiras, de madeira ou arame, são estreitas, permitindo passar apenas um animal.

Porém, depois de Piedade e até Sousa, encontrei muitos mata-motos. São mata-burros de ferro, com as vigas no sentido longitudinal. Ou seja, as vigas estão no mesmo sentido da estrada. Para os pneus largos dos automóveis não tem problema. Mas os pneus das motocicletas podem se encaixar nos vãos entre as vigas e provocar um acidente. Bicicletas são seres alienígenas naquele mundo e só passam empurradas. Mas todo mundo só anda de moto lá agora, um fenômeno recente. O motoqueiro precisa ir muito devagar, para acertar a viga, como um burro manhoso a escapar do pasto.  

2 comentários:

  1. Vai dar outro livro. Aliás, já deu :-)

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    1. É. Já deu, se v. quiser chamar o blog de livro. Acho que depois de tudo publicado, vai dar o equivalente a umas 70 páginas de livro.

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